Sete juízes federais do Paraná referiram, em depoimentos à Procuradoria da República em Curitiba (PR), que o desembargador federal Dirceu de Almeida Soares, 64 anos de idade, membro do TRF da 4ª Região, com sede em Porto Alegre, intercedeu por advogados e clientes destes, pressionando pela concessão de decisões favoráveis.
Segundo reportagem publicada, ontem, pelo jornal O Estado de S.Paulo, os sete magistrados prestaram depoimentos sigilosos, numa investigação que corre em segredo sobre a suposta venda de sentenças. O tema também é destaque, hoje, na edição do jornal Folha de Londrina.
As duas matérias trilham a mesma linha, mas diferem num ponto. O Estadão afirma que o expediente contra o desembargador tramita no TRF-4. Já o jornal londrinense escreve que "o processo sobre suspeita de vendas de sentenças segue em segredo no STJ e envolve pelo menos quatro advogados identificados".
De acordo os dois jornais, o desembargador teria chegado a entregar uma sentença já redigida à juíza federal Ana Beatriz Palumbo, da Vara Federal de Paranaguá, determinando a não-cobrança de imposto sobre serviços (ISS) dos escritórios de Advocacia de Curitiba, pedindo-lhe que apenas assinasse a decisão.
A juíza Ana Beatriz - segundo O Estadão - se lembra de "comentário que havia escutado no sentido de que, por vezes, sentenças eram entregues prontas, redigidas pelos próprios advogados interessados".
Os autos do expediente citam, pelo menos, quatro advogados, entre eles Roberto Bertoldo, ex-conselheiro de Itaipu, que tem como clientes os deputados José Janine, líder do PP na Câmara, e José Borba, líder do PMDB, ambos do Paraná.
Nos sete "termos de declaração", firmados em setembro do passado - e obtidos pelo jornal O Estado de S. Paulo, que revelou a matéria com primazia nacional - os juízes relatam situações em que se sentiram "pressionados" e "constrangidos" pelo desembargador Dirceu de Almeida Soares. Refere o texto que "Soares lhes pede para atender a advogados muito amigos, insistindo que os juízes lhes digam que o desembargador havia falado com eles previamente sobre seus casos".
O juiz Ricardo Rachid de Oliveira, da 2ª Vara Cível Federal de Curitiba, conta que recebeu um recado do desembargador para que ?não decidisse um determinado processo sem falar com ele?. Depois, o desembargador ligou, pedindo-lhe para receber um advogado: "É muito amigo meu, atenda".
À juíza Vera Lúcia Ponciano, o desembargador teria tido o cuidado de recordar que, se o advogado Bertoldo lhe perguntasse se ele já havia falado com ela, "era para dizer que sim". O cliente de Bertoldo - no caso - era Ricardo Saboia Khury, ex-diretor do Banestado.
Na época já havia uma decisão da Justiça Federal do Paraná de quebrar o sigilo bancário de Khury. Ele era acusado de participação em crimes com empresa fantasma e de movimentar em sua conta 49 vezes mais que sua renda declarada em 1998, e 28 vezes mais, em 2000. Isso ocorreu em março de 2003, durante as investigações do caso Banestado, usado por doleiros para enviar dinheiro para o exterior com contas laranjas e a conivência de diretores de bancos.
O desembargador teria questionado a juíza Ana Carine sobre por que havia indeferido liminar pedida por "um grande amigo seu", o advogado Roberto Morel, cuja cliente, a empresa Ginap, queria redução de imposto de importação de pneus. Dias depois, o advogado entrou com pedido de reconsideração da decisão. A juíza conta que "se sentiu extremamente pressionada".
Segundo O Estado de S. Paulo, "ponto em comum nos depoimentos é que os juízes afirmam não terem cedido às supostas pressões do desembargador". Diante da recusa do juiz Nivaldo Brunini, para que "amolecesse a mão" e reconsiderasse um pedido de liminar para liberar roupas fabricadas na China com etiquetas falsas do Brasil, apreendidas pela Receita, o então juiz Soares - na época diretor do foro da Justiça Federal em Curitiba, foi irônico, segundo o relato: "Olha, no que precisar da gente na direção do foro, estamos às ordens".